terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

VALES, ANOTAÇÕES E INCERTEZAS

o silêncio é ensurdecedor
o calor é suor

o meu silêncio ofende
penetra pela fenda do vale

e de que vale
olhar a vida
com certo ar metido de discernidor
se notar o que poucos notam
é aterrador

se notar a verdade
que interessa pouca gente
praticamente
não vale um vale-transporte
não vale um vale-refeição
um grampo, nem um vale-gás

no fim eu é que pago o vale
e tudo pra mim é caro

sempre rasgo a nota amarela de vinte
sempre anoto idéias num guardanapo
sempre gravo idéias no celular
e quando termino ninguém nota
o que eu ando anotando

sobra passagem de ida
para uma espécie de exílio
forçado

entro como fugitivo
ou bandido temido
ninguém mora ao lado

no fundo eu sei
que brincar de se calar
é ensurdecedor

por que o silêncio
às vezes
é blasfemador
ultrapassa os 40 graus

o calor abrasa
o grito esvazia
o gelo da imperfeição derrete

e a cegueira que me acomete
e me impede de tocar
é como o tato que se repete
e me impede de ver

eu ouço gostos
grito cheiros

e dentro da minha imprevisível
previsão do tempo
eu posso chover

12 comentários:

  1. Daniel, gosto do seu jogo de palavras nos poemas, feito esse do vale.

    Gosto da forma inteligente e criativa de escrever, trazendo sentimentos e pensamentos, com o clima, com a temperatura.

    Seu poema me passou um desabafo, uma angústia, uma inquietação.

    São trechos assim que me deixa parada apreciando sua escrita:
    "eu ouço gostos
    grito cheiros"


    Gosto de ler você. beijo

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  2. Lindo!
    Me encanta as expressões da alma,inspiradas e exteriorizadas no ar...
    Lindo dia pra ti!

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  3. Tem presente pra ti no meu cantinho(Palavras em vão)

    Beijos no teu coração!

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  4. Anotações e incertezas que levam a criar uma linda poesia - entre vales e silêncios... e calor.

    Abraço, Daniel!
    Enquanto isso, aqui ainda faz muito frio.

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  5. Sabe, Daniel, eu gosto de muita coisa que tu escreves e gosto mais ainda de sentir o que tu expressas, mas neste poema foi diferente:
    ele me levou até a fronteira do suportável ou aos registros de um dia massacrante de calor, silêncio e grito. Um encadeamento de humores e o desdobramento de sentires.
    A partir de uma paisagem - um vale - entraram o valor das coisas e o papel - que é um vale - alguma coisa qualquer...
    O vale deflagra e a partir daí, foi como tocar no primeiro dominó e no efeito em cadeia dominós, formaram um desenho belíssimo que resultou neste poema. Uma cadeia de vales e o teu registro poético. Fantástico!
    Pode nem ser nada disto mas o efeito deste teu poema em mim, foi dos melhores que já li aqui.
    Para mim falaste na 'sobrevivência' e sua arte.

    Um abraço e um carinho.

    E preciso dizer que me sentí imensamente honrada por ter sido agraciada com sua indicação.
    Já copiei o selinho. Eu demoro a por no blog, mas estará no slide, tão logo eu consiga.

    Muito, muito grata e parabéns pelo selo que recebeu e pelo poema, alento em um dia massacrante.

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  6. Caro, já choveu em letras e em beleza!
    Não te aflijas com o que certamente não vai te matar.
    És sobrevivente e dos melhores!

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  7. Daniel, tua postura em relação a geografias e etc é corretíssima e fez com que eu lembrasse de John Lennon em "Imagine".
    Sei que coisas que alguém decide na China me afeta , sei que somos a humanidade mas não é assim para o sistema.
    Então, que os latinos tenham mais união entre si.
    Vizinhos.
    Grata pela riqueza do teu comentário.

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  8. Gosto cada vez mais dos teus poemas, Daniel. Este é de uma intensidade absurda. E este final, redime: "posso chover". Magnífico.

    Fiquei super, super feliz com a indicação do meu blog. Agradeço de coração. :) Beijoos.

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  9. Oi Daniel...gostei da forma como rasgou as impressões...
    Brincar de calar agride os tímpanos,fere as vezes a alma...ensurdece o coração e ainda faz chover dentro do seu imprevisível...
    Anotar idéias num guardanapo...já fiz isso também..rsrs
    Um abraço na alma

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  10. Daniel gostei muito das suas palavras.
    São carregadas de sentimentos.

    abraços e um otimo feriado.

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  11. Deixa chover
    Ah! Ah! Aaaaaaah!
    Deixa a chuva molhar
    Dentro do peito
    Tem um fogo ardendo
    Que nunca vai se apagar... ;-)

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  12. mas há momentos em que somente o silêncio nos faz ouvir algo.

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Adorei a sua companhia no caminho dos plátanos. Volte quando quiser!